É mais ou menos um caso de punição ao bom pagador. Essa é a avaliação de alunos que estão com as parcelas em dia no Sistema de Financiamento Estudantil (Fies) e que, justamente por isso, ficaram de fora dos descontos oferecidos pelo governo federal neste ano. O prazo para renegociar dívidas começou na última segunda-feira (7).
Em dezembro, o presidente Jair Bolsonaro (PL) editou a Medida Provisória nº 1.090, que estabelece que estudantes que usaram o Fies para financiar as mensalidades de uma universidade privada tenham direito a um abatimento de até 92% no valor devido.
Essa facilidade, no entanto, foi dada apenas a que está com atraso de, no mínimo, 3 meses no pagamento. Para os que vêm conseguindo bancar as parcelas, não há nenhum benefício – daí o motivo da revolta. (entenda mais abaixo os detalhes da MP).
Beatriz Barauna, de 24 anos, é uma das alunas insatisfeitas com o funcionamento da MP. Em fevereiro, a jovem foi ao banco, com a esperança de obter algum desconto nos mais de R$ 35 mil que terá de pagar até 2035.
“Cheguei lá e descobri que, como nunca atrasei nenhuma parcela, não tenho direito a nada. Fiquei revoltada. Seria melhor não pagar, então, e ignorar todas as ligações de cobrança do banco? Se eu tivesse ficado de boa esses anos todos, receberia 92% de desconto agora?”, questiona.
Beatriz formou-se no ano passado, em uma faculdade particular de Ilhéus (BA), mas ainda não conseguiu emprego na área. Ainda assim, a cada dois meses, ela tem de pagar R$ 150 (para amortização dos juros). “Estou sem renda, recebendo ajuda da minha mãe, que é professora. É um dinheiro muito suado”, diz.
A partir de junho de 2022, a jovem ainda precisará desembolsar parcelas de R$ 400 para quitar sua dívida completa.
“Só tenho 24 anos, quero comprar uma casa e um carro, preciso do meu nome limpo. Tento ao máximo pagar tudo em dia. A medida de dar descontos é positiva, mas deveria valer para todos. Não é porque estou pagando que está fácil pagar”, afirma.
O g1 entrou em contato com o Ministério da Educação (MEC) para saber se há a possibilidade de ampliar o alcance da MP para adimplentes, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
‘Fazer sacrifício para pagar pelo que algumas pessoas vão ter de graça’
Amanda Cordeiro, de 30 anos, conseguiu o diploma de engenheira de produção em 2019, após financiar o curso em uma instituição de ensino privada de Curitiba. Desde o ano passado, ela tem de pagar parcelas de R$ 500 (equivalentes a 25% de sua renda) para quitar a dívida.
“Sou grata ao Fies, porque não teria estudado sem ele. A mensalidade da faculdade era maior que a do meu salário como técnica de enfermagem [emprego dela à época]. Mas ver uma dívida de R$ 60 mil é desesperador. Eu achava que ganharia bem depois de formada”, conta.