Jovem autista é impedido de entrar em ônibus de Curitiba com cão de serviço

Kaito Brito tem 29 anos e é um jovem bem ativo, vive normalmente como qualquer jovem da idade dele, mas vive com autismo. Depois que Bolt entrou na vida dele, as crises diminuíram e ele descobriu a importância de um cão de serviço para acompanhá-lo no dia-a-dia. Recentemente, Kaito e Bolt foram barrados em um ônibus do transporte público de Curitiba. Após a repercussão, a Prefeitura prometeu resolver a situação.

Parte do momento em que ele foi expulso do ônibus do transporte público foi registrada pelo próprio jovem. Kaito contou à Banda B que um funcionário da Urbanização de Curitiba (Urbs) lhe disse que ele não poderia ficar no ônibus com o cão.

“Eu liguei e falaram que não posso liberar, então não posso liberar. Não é culpa minha, o município disse que não tem regulamento pra isso, então não posso liberar”, dizia o funcionário do transporte público.

Kaito contou que, na ida, embarcou no transporte público normalmente. Na volta, não conseguiu chegar em casa.

“Motorista e alguns passageiros questionaram, porque estão até acostumados a ver a gente no ônibus, e não deram importância. Me ignoraram. Falei que eu tinha entrado em contato com o Ministério Público e queriam que eu tivesse um documento que comprovasse que eu poderia estar com o cão de serviço no ônibus”.

 

Após a situação, aconteceu com Kaito exatamente o que ele queria evitar: teve uma crise no meio da rua.

“Uma crise em plena avenida. O meu cão me deu suporte, até que uma pessoa me perguntou se eu precisava de ajuda e me deixou entrar em uma autoescola. Foi aí que consegui contato com o pessoal da Secretaria da Pessoa com Deficiência e me buscaram para me levar para a casa, porque se não eu iria ficar no Centro”.

O jovem disse que tudo o que passou fez com que se sentisse humilhado. E ainda com mais medo de sair de casa.

“Eu estava em uma praça, muita gente assistiu tudo, e eu ainda depois tive uma crise no meio da rua. Me senti mais vulnerável ainda. Como as pessoas não conhecem o trabalho do cão de serviço ainda tentaram retirar o cão de mim, o que pioraria a situação”.

Conforme explicou o rapaz, a orientação é para que não retirem o cão de serviço – que costuma estar sempre identificado – de perto da pessoa.

Cão de serviço

 

Kaito vive com autismo e tem Bolt há alguns meses. O cachorro atua da mesma forma que o cão-guia para um cego, mas no caso do autismo ele funciona como um alerta para que o autista perceba que está prestes a ter uma crise.

“Ele é um cão que está fazendo um serviço. As pessoas confundem com suporte emocional, mas não é o caso dele, que foi treinado para me alertar. No meu caso, ele começa a me alertar, sobe em mim, para que eu perceba que estou tendo uma crise”.

O jovem disse que, estar com o cão, lhe deu ainda mais independência.

“As pessoas esquecem que autistas crescem e não temos como ficar dependendo de outras pessoas para sempre. Por isso o cão de serviço está ali para isso, para me auxiliar no momento em que eu precisar”.

 

 

Promotoria entra no caso

 

Ao saber da situação de Kaito, a promotora de Justiça Luciana Linero, da promotoria de proteção ao direito da pessoa com deficiência de Curitiba, entrou no caso. Ela explicou que a lei não estabelece quais são as tecnologias utilizadas para cada pessoa.

“Justamente porque a utilização vai evoluindo com o passar do tempo. Hoje o cão de serviço também é utilizado para outras deficiências como o autismo, e aí o uso deve estar garantido assim como já estava garantido no caso dos deficientes visuais”.

Conforme a promotora, existe ainda muito preconceito, mas não por maldade e sim por desconhecimento.

“É por falta de conhecimento. As pessoas imaginam que as assistências são só para o caso de a pessoa não conseguir enxergar, mas existem muitas outras que precisam da mesma forma”.

Para resolver a situação do jovem, mas também já antecipar problemas futuros com outras pessoas que venham a precisar do cão de serviço (já que também está prevista a possibilidade para surdos, por exemplo), foi marcada uma reunião entre a Prefeitura de Curitiba e a promotoria.

“A ideia é que a gente possa resolver isso em nível administrativo, da melhor forma possível, para evitar ter que entrar com uma ação contra a Urbs para que possa reconhecer o direito. Vamos trabalhar essa questão para que tenham essa compreensão de que a interpretação da lei não pode ser restritiva”.

 

O que disse a prefeitura?

 

Quando procurou a Prefeitura de Curitiba, Kaito foi informado que ele não poderia estar com o cão no ônibus.

“Quando abri a reclamação no 156 ainda me ameaçaram de chamar a Guarda Municipal, sendo que quem está errado são eles. Mesmo não tendo uma lei municipal, existe uma lei federal que diz que pessoas com deficiência têm o direito de tecnologia assistiva”.

À Banda B, a Prefeitura de Curitiba disse que está elaborando a regulamentação para assegurar às pessoas com deficiência o direito de ingressar com cão de assistência no transporte coletivo. Segundo a prefeitura, “hoje, de acordo com o decreto 1.356/2008, é proibido transporte de animais nos ônibus, com exceção do cão-guia, reconhecido por lei como acompanhante apenas de pessoas cegas ou com baixa visão”.

A prefeitura reconheceu que a figura do cão assistente é considerada um recurso de tecnologia assistiva pela Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, mas disse que, por se tratar de um tema novo, ainda depende de regulamentação.

“A regulamentação deve prever uma série de requisitos para que o cão assistente possa ser utilizado no transporte coletivo, como laudo do profissional de saúde, carteira de vacinação atualizada, uso de colete de identificação, microchipagem; dados do adestrador, identificação gerada pela Prefeitura e ainda informação do condutor com foto”.

Sobre o caso específico de Kaito, a prefeitura disse que este foi o primeiro caso deste tipo em Curitiba, desde a promulgação da lei. “A Urbs e o Departamento dos Direitos da Pessoa com Deficiência, da Secretaria Municipal de Governo, vão trabalhar em conjunto para, em caráter excepcional, permitir o acesso de ambos ao transporte coletivo até que a regulamentação seja publicada”.

 

 

 

Por; Banda B