Fundação de ensino técnico de Barueri proíbe alunos de usarem shorts fora das aulas de educação física

Estudantes da Fundação Instituto de Educação de Barueri (FIEB) são proibidos de usar shorts e bermudas fora das aulas de educação física. Uma aluna da unidade Aldeia da Serra alegou ter sido constrangida a trocar de roupa na escola
Em uma rede social, mais alunas relataram terem sido constrangidas pelos funcionários por estarem usando shorts.
A aluna ouvida pelo g1 contou que, no começo do ano letivo, a coordenação da escola realizou uma reunião com os alunos informando que seriam aceitos somente calça jeans e blusa lisa como uniforme.
“Na época eu questionei se não poderíamos usar shorts, afinal estava muito calor, e a coordenadora disse que não porque o uniforme já estava definido no manual do aluno. Logo depois, um menino perguntou se ele poderia ir com a bermuda da escola que tinha comprado, e ela disse que sim”.
A aluna informou que mesmo depois da reunião continuou indo de bermuda para o colégio. No dia 8 de março, Dia da Mulher, ela e um grupo de amigas combinaram de ir de shorts para a escola. Na entrada, uma das amigas foi abordada pela coordenadora e ela obrigou que a garota colocasse uma calça.
“Na hora do intervalo, a coordenadora ficou me encarando. Quando ela nos abordou, segurando duas calças na mão, quase gritando e mandando a gente trocar de roupa, eu me recusei e falei que ia passar calor, nisso ela falou ‘não interessa se você não trocar vai conversar com a diretora’. Eu fiquei assustada e não quis discutir, então apenas troquei de roupa”, informou a aluna.
“A gente tentou planejar também um protesto sobre isso, mas parece que a informação foi repassada para a diretora, e ela convocou todos os representantes de sala e informou que se acontecesse algo do tipo as consequências iriam recair sobre eles, ela alegou que a gente tava querendo incitar uma rebelião na escola”, completou.
Em uma rede social, outras alunas da FIEB relataram que se sentiram constrangidas por funcionários pela roupa que estavam usando. “Já fui parada até por usar moletom, falaram que estava muito justo no meu corpo”, informou uma aluna.
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Relato de uma aluna da escola Aldeia da Serra. — Foto: Reprodução/ Instagram
Uma outra alegou que um funcionário chegou a falar que a roupa dela estava muito indiscreta.
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Relato de uma aluna da Fundação em uma rede social. — Foto: Reprodução
A funcionária pública Roselaine Soares, do Coletivo Juntas por Barueri, enviou uma carta endereçada à instituição. “Uma vez que referida indumentária é adequada ao clima de verão e dias de calor, não sendo incompatível ao ambiente escolar, tais pedidos de troca de roupa se revelam desnecessários, gerando tão somente constrangimento e indignação às alunas”.
O coletivo ainda não teve nenhuma resposta até o momento. “A gente entende que são atitudes muito equivocas dentro de uma escola, um lugar que deveria promover o debate dessas questões tão importantes a respeito da cultura do estupro, das questões que envolvem gênero e diversidade, e a escola não está fazendo esse papel”, disse Roselaine.
O regimento das escolas mantidas pelo Fieb diz que o aluno deve “usar diariamente o uniforme completo para as aulas regulares e especiais, tais como aulas de laboratórios, oficinas culturais, visitas, passeios, estudos do meio e para a prática de educação física”.
E no Manual do Aluno de 2022, o uniforme descrito para as aulas regulares, por meio de um desenho, mostra os alunos de calça comprida, seja a do uniforme ou calça jeans. Em nota, a Prefeitura de Barueri informou que a Fundação Instituto de Educação de Barueri não permite discriminação em relação a gêneros e disse ainda que “o uso de bermudas/shorts dentro das Unidades FIEB para os alunos do ensino médio não é permitido, conforme consta no Manuel do Aluno de 2022”.
Disse ainda que “o uniforme oficial da FIEB poderá ser adquirido na Associação de Pais e Mestres – APM das unidades escolares. O aluno que não adquirir o uniforme deverá utilizar camiseta branca sem estampas e calça jeans (gn). Não será permitida a entrada de alunos com uniformes alterados, cortados ou rasgados. O uso do uniforme se faz necessário para qualquer atividade exercida dentro da escola, ou quando o aluno estiver representando a instituição”.
A fundação informou também que “a escolha das peças que compõem o Uniforme é de caráter institucional e que em nada tem a pretensão de estabelecer padrões discretos ou indiscretos, uma vez que isso é uma referência pessoal. A nós cabe apenas determinar uma vestimenta que seja confortável e que identifique nosso alunado, inclusive, para que ele possa ser identificado caso necessite de apoio no trajeto escolar”.
Em toda a rede municipal de Barueri, a Prefeitura informou que a pedido do Conselho Municipal de Educação, as regras dos uniformes estão sendo revistas. Atualmente, além do uniforme que os estudantes recebem da própria Prefeitura, é permitido o uso de camiseta, calça jeans ou bermuda.
O advogado Ariel de Castro Alves, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais e membro do Instituto Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, afirmou que escolas públicas que exigem determinadas roupas ou uniformes, devem fornecê-los gratuitamente aos alunos e reforçou que submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância – no caso das meninas que tiveram que trocar de roupa no ambiente escolar – a vexame ou a constrangimento fere o artigo 232 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
“Esses casos demonstram que os dirigentes e servidores de algumas escolas não cumprem seus papéis sociais e pedagógicos. Além disso, descumprem as leis que garantem os direitos ao respeito, a liberdade e a dignidade dos alunos, como previsto no ECA. O Estatuto também trata da obrigação das escolas respeitarem os valores, a cultura e os contextos sociais dos estudantes, e prevê que submeter crianças e adolescentes a vexame e constrangimento configura crime”, afirma.
Ariel reforça que conforme a denúncia e o relato da estudante, somente as meninas foram reprimidas e obrigadas a usarem calças, o que denota discriminação de gênero e uma atitude machista. E que, as peças de uniformes exigidas pelas escolas devem conter conter calças, shorts, camisetas comuns e regatas e saias.
Alunas retiradas de sala de aula na Zona Norte de SP
No dia 9 de março, alunas da Escola Estadual Parque Anhanguera, na Zona Norte de São Paulo, afirmam que foram retiradas de sala de aula por funcionários da unidade escolar por estarem usando cropped, regatas e calças rasgadas.
Segundo uma comunicado redigido pelos alunos e postado em uma rede social, os funcionários da escola passaram de sala em sala pedindo para que todas as alunas mulheres se levantassem, e aquelas que estivessem com uma roupa que a escola considerasse inapropriada foram retiradas da sala e mandadas para a secretaria da escola.
As alunas que estavam usando moletons e casacos informaram que foram obrigadas a tirarem as peças para que as funcionárias conferissem a roupa que estava por baixo.
Ariel afirmou que a atitude da escola contraria “frontalmente as finalidades educacionais e sociais da escola. E mostra que alguns funcionários e dirigentes de escolas desconsideram as leis vigentes no país, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Maria da Penha e o Estatuto da Juventude”.