TJ devolve área de 7,3 mil hectares para dono após 32 anos em MT

A Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça (TJMT) rescindiu um contrato firmado nos anos 1990 entre produtores rurais após os “compradores” não cumprirem sua parte no acordo, num negócio que envolve três propriedades de mais de 7,3 mil hectares. Os magistrados da Primeira Câmara de Direito Privado seguiram por unanimidade o voto do desembargador João Ferreira Filho, relator de um recurso (apelação cível), ingressado por José Xavier Silva, dono das terras “vendidas” à Jaime Basso, que não cumpriu sua parte no acordo.

A sessão de julgamento ocorreu no último dia 19 de julho. O magistrado atendeu um pedido do escritório Gomes e Curado.

De acordo com informações do processo, José Xavier da Silva negociou três propriedades rurais em Mato Grosso – a fazenda Marquesa, em Pontes e Lacerda/MT (564 KM de Cuiabá), além das fazendas Maringá e Recanto Feliz, ambas em Comodoro/MT (640 KM da capital). Jaime Basso, que tinha interesse nas terras, se comprometeu a pagar em troca uma propriedade rural de 3 mil hectares, localizada em São Domingos do Azeitão (MA), e mais 105 mil sacas de soja que seriam transferidas entre os anos de 1998 e 2000.

Os autos seguem a narrativa, e revelam que José Xavier da Silva cumpriu sua parte no negócio, porém, Jaime Basso não transferiu a propriedade rural do Maranhão, além de ter transferido aproximadamente 100 mil sacas de soja “ao preço que quiseram e do jeito que bem entenderam”.

A discussão foi parar na justiça, que deu uma decisão favorável na primeira instância aos “caloteiros”, proferida pelo juízo da 6ª Vara Cível de Cuiabá, que acatou a tese de “prescrição” da cobrança. A sentença entendeu que o negócio, realizado em 1998, só poderia ser questionado no judiciário até 2008 (10 anos), como prevê o código civil para estes tipos de processos. Como a citação das partes que não cumpriram sua parte no acordo ocorreu em 2009, o tempo hábil para ingresso de ações judiciais havia se esgotado.

Em seu voto, no entanto, o desembargador João Ferreira Filho explicou que até o advento do Código Civil, no ano de 2003, a legislação anterior estabelecia que a prescrição ocorreria em 20 anos. O magistrado segue seu esclarecimento, e lembra que com o novo período estabelecido pelo Código Civil de 2003 (10 anos), nos processos que ainda não haviam chegado a metade do prazo prescricional da legislação anterior (20 anos), o novo período de prescrição deveria contar a partir de 2003 – e não da data do negócio.

Ou seja, em 2003, com o advento do Código Civil, haviam se passado apenas cinco anos do negócio entre os proprietários rurais, que firmaram o contrato quando a legislação estabelecia a prescrição em 20 anos. Assim, quando os “caloteiros” foram citados, em 2008, havia ainda um prazo de cinco anos para o ingresso do processo, que poderia ser proposto até 2013. João Ferreira Filho citou o entendimento já consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

“O STJ realmente consolidou o entendimento de que ‘havendo redução do lapso temporal pelo CC/2002 e, quando do início de sua vigência não tiver decorrido a metade do prazo anterior, deve ser aplicado o novo prazo menor, porém tomando como termo inicial o dia 11.01.2003, quando iniciou a vigência da nova lei substantiva’ (AgRg no REsp n. 1.335.993/DF), sendo, portanto, desacertada a fixação do termo inicial do prazo prescricional decenal em data diversa”, explicou o desembargador.

João Ferreira Filho foi além, e revelou que os “caloteiros” sequer justificaram o não cumprimento do acordo nos autos de maneira satisfatória. “Elementos documentais mostram que a transferência dos imóveis prometidos pelos réus/compradores aos autores/alienantes não ocorreu, como mostram as cópias das matrículas do Cartório de Registro de Imóveis, que revelam, pior ainda, que foram transferidos para o nome de terceiros, e nenhuma palavra crível e veraz foi alinhada pelos réus para justificar a situação de ruptura obrigacional durante um período que já perdura quase 20 (vinte) anos”, analisou o desembargador.

Além de acatar o pedido de José Xavier Silva pela rescisão do contrato, o desembargador também determinou que as propriedades rurais de Pontes e Lacerda e Comodoro sejam devolvidas ao antigo dono. O agricultor também pede nos autos uma indenização de R$ 100 milhões pelo uso das terras de forma indevida pela família Basso ao longo desses anos.

O pedido de indenização também foi reconhecido pela Primeira Câmara de Direito Público, entretanto, o valor exato ainda será calculado em sede de liquidação de sentença.

 

 

Por; Folhamax